A geógrafa e enóloga duriense Lisete Osório foi distinguida com as insígnias de “Diplomata Civil Humanitária – Chaplain” pelo contributo no setor vitivinícola e do desenvolvimento sustentável da Região Demarcada do Douro (RDD) e do Douro Internacional, um galardão entregue no Palácio da Cidadela, em Cascais.
Com uma trajetória que soma mais de uma década dedicada à fileira do vinho e da vinha, Lisete Osório tem contribuído para o desenvolvimento e sucesso da RDD, dentro e fora de portas.
Esta distinção surge por indicação, como se recebe a notícia que o seu nome é proposto para integrar a lista de Diplomatas Civis Humanitários?
Foi um misto de surpresa e uma honra muito grande. As questões da sustentabilidade e humanitárias são algo que faz parte de mim, da minha família.
Desde sempre tive preocupação em ajudar as pessoas mais desfavorecidas, dar-lhes o meu apoio.
Já enviei diverso material escolar para escolas na Guiné Equatorial e participei em ações quando se iniciou a guerra na Ucrânia, são apenas dois exemplos do que tenho feito neste campo.
Esta distinção é o culminar de várias coisas que fui fazendo ao longo da vida paralelamente à minha vida profissional e inserido nela. Sempre que saio do país para países mais desfavorecidos tento arranjar alguns dias para prestar voluntariado e apoio na área social.
Que mais valias oferece esta distinção?
Acima de tudo dá o suporte técnico e legal para as ações que posso desenvolver. Quando sair, agora já não o farei sozinha, terei comigo uma rede de apoio que é muito importante nestas situações, permitindo-me atuar de forma mais efetiva.
É uma entidade reconhecida e que atua em mais de 190 países, isto é uma grande mais-valia para o que faço. Digamos que desta forma fico mais salvaguardada, diminui o risco.
A sua vida profissional iniciou com uma experiência em Espanha a trabalhar num projeto que envolvia municípios espanhóis e portugueses. De que forma é que esta experiência de trabalho transfronteiriço moldou o seu trajeto daí em diante?
Pouco tempo depois de acabar o curso quis ter uma experiência de voluntariado fora do país, mas surgiu a oportunidade de fazer uma pós-graduação em sustentabilidade na Universidade Católica do Porto e uma oportunidade de emprego, situações que foram adiando esse meu desejo.
Quando surgiu a hipótese de ir trabalhar para Espanha, na área do turismo e do desenvolvimento rural, estava longe de imaginar que essa experiência me ia despertar tantas paixões.
Foi lá que comecei a trabalhar numa Organização Não Governamental (ONG) ligada ao ambiente e ao apoio a pessoas mais desfavorecidas. Ao fim de semana tínhamos atividades que me fizeram interessar mais ainda pelo tema levando a cabo diversas atividades com o apoio do Governo de Castilla Leon e da União Europeia.
Foi um tempo muito feliz, gostei muito desta experiência em Espanha.
De lá para cá já estive em países como Timor, Angola, Índia, Nepal ou Butão, viagens que me permitiram estar em contacto com pessoas e culturas diferentes.
Têm sido cerca de 20 anos muito marcados não só pela atividade profissional como pelo meu envolvimento nestes projetos.
É clara essa preocupação com o próximo. Sendo também enóloga, como é que estas preocupações se refletem nos vinhos que assinas?
Na produção de vinhos esta preocupação reflete-se desde logo na vinha, trabalhamos em produção integrada e tentamos ser o mais naturais possível para que depois, na adega, não tenhamos de andar a adicionar qualquer produto intervindo o mínimo nos vinhos.
Tentamos contratar pessoas da região, contudo com a falta de mão de obra que se regista na região acabamos por ter de trabalhar com muitos estrangeiros em especial oriundos do Nepal e Bangladesh. São pessoas com uma cultura de trabalho muito afincada e estou muito satisfeita com eles, criamos amizade e acabaram por ser eles a incentivar-me a conhecer o Nepal, por exemplo.
Na adega tudo isto se reflete também na utilização de materiais recicláveis e reutilizáveis, tentar ser o mais sustentável possível causando o menor impacto possível numa agricultura minimalista.
Vivemos uma época em que o destaque vai para o fecho de fronteiras, aplicação de taxas alfandegárias elevadas e vários outros desafios. São tudo barreiras ao trabalho que desenvolve?
Desafios sempre tivemos, ciclicamente passamos por crises e guerras, este é só mais um desses momentos.
Quem consome vinho vai continuar a consumir. Fecham-se umas fronteiras, mas abrem-se outras. Há muitas oportunidades que devem ser exploradas, por vezes centramo-nos demasiado no problema e não nas soluções.
Vivemos um tempo que nos coloca grandes desafios a nível interno e internacional, temos um mercado que está a fechar portas, mas temos uma panóplia de países, de novos consumidores e tendências que devemos aproveitar. Temos de explorar outras geografias, outras latitudes.
Pegando no título que recebeu, o Douro é uma região humanitária e sustentável?
O norte de Portugal, e o Douro em concreto, é uma região conhecida como acolhedora.
Sabemos acolher tanto turistas como os emigrantes que para cá vêm em busca de uma vida nova. Somos um povo que sabe acolher e integrar as pessoas na nossa cultura.
Somos humanitários, estamos a saber receber estas pessoas porque também precisamos deles, a nossa região está cada vez mais envelhecida e precisamos de gente em idade ativa.
Devemos criar mais cooperação entre as diferentes entidades e agentes do território, pensando em outras formas de trabalhar o vinho e promovê-lo, tal como ao turismo.
Temos de tomar uma atitude conjunta, procurando soluções dentro de portas e não fora. Temos de nos unir com esse objetivo.
É um desafio muito grande, mas se o trabalho for feito em parceria, certamente que encontraremos uma saída para os problemas que nos surgem.