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Douro exige medidas em momento “difícil”

Com mais uma vindima à porta os problemas da viticultura duriense voltam a dominar as preocupações na região. Apesar da quebra prevista na produção, o já revelado corte no benefício veio aumentar ainda mais a incerteza de quem vive da produção vinícola.

Sinal crescente das preocupações na região são as ações de protesto que têm levado centenas de viticultores às ruas, tendo o tema já sido discutido na Comissão de Agricultura, na Assembleia da República, com os profissionais do setor.

Quebra expectável de 20%

Como habitual, a previsão de produção para a vindima de 2025 da Região Demarcada do Douro foi apresentada pela Associação para o Desenvolvimento da Viticultura Duriense (ADVID), com sede em Vila Real.

Luís Marcos, diretor-geral da organização, referiu-se a “um ano atípico, quer em termos meteorológicos, quer do ciclo vegetativo da videira. A floração foi boa, mas as vinhas foram, depois, afetadas por doenças como o míldio e também o escaldão em junho”, fatores que deverão afetar a produção.

“Este ano, apesar do intervalo de produção ser inferior aos valores do ano passado, apontamos que ele estará abaixo do intervalo mínimo da previsão, podendo ter valores que rondam menos 20% face a 2024 (270 mil pipas), ou seja, valores a rondar as 220 mil pipas”, referiu Luís Marcos. “Aquilo que nós verificámos é que a fertilidade, ou seja, o número de cachos por videira é inferior na generalidade das vinhas da região. Este ano os cachos apresentam um tamanho inferior”, salientou.

Ainda de acordo com o responsável associativo, “o inverno foi bastante seco e quente, o que atrasou o ciclo vegetativo da videira. A floração foi atrasada em relação à média e, durante os períodos pré e durante a floração, verificou-se uma incidência muito grande de míldio”.

A incidência da doença não é igual em toda a região e as zonas mais afetadas são as do Baixo Corgo e outras mais altas, como Alijó, Sabrosa e Vila Real.

“Benefíco” cai para 75 mil pipas

O corte de 15 mil pipas relativamente à vindima de 2024 foi conseguido após uma negociação que os presentes classificaram como “difícil” e que incluiu contrapartidas do setor do comércio.

“A aprovação do Comunicado de Vindima para 2025 é o resultado de um esforço significativo de diálogo e responsabilidade entre todos os intervenientes do setor. Num momento particularmente exigente para a fileira da vinha e do vinho, o Conselho Interprofissional conseguiu encontrar um equilíbrio que, não ignorando os sinais do mercado, protege a sustentabilidade económica e social da Região Demarcada do Douro.

O IVDP está profundamente empenhado em responder aos desafios estruturais que hoje se colocam. A apresentação do plano de ação, que contou com o envolvimento direto do Ministro da Agricultura, é um passo decisivo para reforçar a resiliência da Região e valorizar o vinho do Porto. Este trabalho continuará a ser feito com os agentes do setor, com diálogo, ambição e sentido estratégico", afirmou Gilberto Igrejas, Presidente do IVDP à saída da reunião.

O responsável pelo instituto público lembrou ainda as últimas previsões que apontam para uma quebra de produção na campanha deste ano.

“Este ano poderá ainda haver uma quebra na colheita na região a rondar aos 20%. Estamos a falar de uma vindima que vai ser mais escassa. E, portanto, todo o cenário foi construído em torno desta vindima”.

António Filipe, Vice-Presidente do Comércio lembrou a dificuldade da negociação e o entendimento que a região conseguiu com o Ministério da Agriculta para os apoios aos viticultores durienses.

“Todos temos de ceder um pouco, considerando as dificuldades que a região atravessa. Teremos de tentar aliviar as dificuldades para o futuro e encontrar soluções. Foi isso que hoje tentamos fazer.

Há 15 dias, conseguimos consensualizar no sentido de os vitivinicultores serem apoiados para as uvas excedentes que não encontram interesse por parte de quem vinifica e estamos de acordo com essa medida. Falámos em conjunto com o ministro da Agricultura e estamos disponíveis para continuar a trabalhar em conjunto para medidas no curto prazo, mas, sobretudo, no médio e longo prazo que permitam corrigir o desequilibro entre a oferta e a procura na Região Demarcada do Douro”.

Nas declarações no final da reunião, Celeste Marques, representante da produção, sublinhou que a preocupação nesta negociação foram os viticultores que a profissão representa, destacando as contrapartidas deixadas pelo Comércio.

“Foi o valor possível. Muita negociação, muito debate, muitos pedidos de solidariedade, muita indicação que não é só sustentabilidade, mas que está em causa também a sobrevivência de alguns viticultores. Todo o trabalho que foi feito foi a pensar nos produtores e na sobrevivência deles.

Também ficou o compromisso de adquirir as pipas que estavam ainda em stock do ano passado, ou seja, as 8.500 pipas que ainda estão na produção do ano passado. E ainda o compromisso de um grupo de trabalho para estudar a aguardente regional para ser incorporada no vinho do Porto”.

Entretanto a direção da Casa do Douro tornou público o Parecer sobre o quantitativo para esta vindima deixando críticas à postura do Comércio no processo negocial.

“A definição de 75.000 pipas de benefício resultou de um compromisso interprofissional em contexto de flagrante assimetria negocial, em que o setor do Comércio, detendo o controlo efetivo sobre a decisão, condicionou a Produção à aceitação de um sacrifício adicional: suportar a restrição do benefício como resposta à necessidade de descongestionamento de stocks de vinho do Porto armazenado.

Do ponto de vista técnico, é fundamental sublinhar não existirem, na campanha de 2025, constrangimentos de ordem fitossanitária ou produtiva que limitem a aptidão da Região para produzir uvas para um benefício de 90.000 pipas. Assim, a limitação decretada não decorre de fatores agronómicos, mas sim de critérios exclusivamente comerciais e conjunturais.

Adicionalmente, importa frisar que o atual modelo de “negociação” não assume, na prática, um verdadeiro diálogo institucional. O Comércio determina unilateralmente as quantidades e preços de aquisição do vinho, relegando a Produção para uma posição de aceitação forçada e sem margem real de negociação, o que compromete a equidade do processo e a dignidade económica dos viticultores.

A aceitação pela Produção do quantitativo de 75.000 pipas foi enquadrada pelo pressuposto objetivo da exigência de inclusão do tema da aguardente regional (AD) nas negociações para a vindima de 2026, por forma a assegurar mecanismos de flexibilidade futura na gestão dos volumes disponíveis”.

Protestos multiplicam-se

Nas últimas semanas têm sido várias as ações de protesto que acontecem na região, em especial na cidade de Peso da Régua, tendo a maior concentração sido realizada dia 2 de julho, organizada pela CNA.

Um protesto que a responsável associativa, Berta Santos, considerou “positivo” pela adesão registada.

"A situação que se vive na região é preocupante e, ou se faz alguma coisa pelo pequeno e médio produtor, ou vamos, a curto prazo, ver parte da região deixada ao abandono, estamos a viver uma verdadeira catástrofe social. A adesão que notamos ao protesto é exemplo disso mesmo", explicou Berta Santos.

A dirigente associativa esteve também em Lisboa para entregar uma Moção ao Governo, documento que saiu da referida manifestação.

“Fomos recebidos, não pelo senhor Primeiro-Ministro, apenas por dois assessores a quem tivemos a oportunidade de comunicar as nossas reivindicações".

O documento, que foi depois também apresentado na Comissão de Agricultura, na Assembleia da República, enumera algumas medidas, “estruturais e imediatas”, que a CNA considera essenciais para a salvaguarda da região e dos seus produtores.

No documento, “rejeita-se veementemente que o quantitativo de benefício para 2025 tenha um valor abaixo do de 2024. Exige-se também que o Estado fixe preços mínimos para as uvas e que estabeleça a proibição da compra de uvas abaixo dos custos de produção, reclama-se que a aguardente a utilizar na produção do vinho generoso seja prioritariamente regional e que seja conferida à Casa do Douro capacidade legal e operacional para ter um papel efetivo na estabilização dos stocks, através da compra e armazenamento de excedentes”.

É ainda reclamada uma fiscalização efetiva na entrada de mostos e vinhos oriundos de fora da região, a compra pelo Estado de stocks excedentários das adegas cooperativas, refrescando o acervo de vinhos armazenados na Casa do Douro, apoios extraordinários que compensem os viticultores pela perda de rendimento, e a programação de uma destilação de crise direcionada prioritariamente para as produções dos sócios das adegas cooperativas e para os produtores que não tenham adquirido vinhos a terceiros.

Governo planeia apoios

José Manuel Fernandes, Ministro da Agricultura, ouvido em audição na Assembleia da Republicana por requerimento apresentado pelo Partido Socialista, o PCP e o Juntos Pelo Povo (JPP), afirmou que espera que “até setembro cheguem aos viticultores do Douro os apoios anunciados para os excedentes de produção”, abrindo a possibilidade de superarem os 13 milhões de euros anunciados.

“Claro que temos os nossos cenários e as nossas previsões. Temos o objetivo de em setembro, e será o Instituto do Vinho do Douro e Porto (IVDP) a fazer isto, tudo esteja resolvido. Quem vai receber a ajuda? É o produtor”, garantiu José Manuel Fernandes.

“No Douro há 18.293 viticultores e 7.485 têm menos de 0,5 hectares”, começou por dizer o ministro. “O stock na região do Douro, e isto é impressionante, são 444 milhões de litros quando nós produzimos 700 milhões de litros em Portugal inteiro”, explicou o ministro.

Na última campanha na região, segundo os números citados pelo ministro, foram produzidos 155 milhões de litros de vinho e vendidos 115 milhões, com nova acumulação de produto.

Entretanto a região aguarda ainda a apresentação de um conjunto de medidas que o ministro garantiu tornar públicas em agosto.

Produção quer Governo a comprar 15 mil pipas

Em missiva enviada ao Ministério da Agricultura, a 17 de julho, a Casa do Douro (CD) reivindica para a região medidas de apoio estruturantes e que garantam uma manutenção dos rendimentos dos produtores.

No documento a que o VivaDouro teve acesso, a direção da CD faz uma proposta de investimento por parte do Estado.

“Considera-se aconselhável um investimento estratégico por parte do Estado Português na aquisição de uma parcela de pipas de Mosto Generoso a beneficiar na campanha de 2025.

Esta parcela resultará da diferença entre o quantitativo estabelecido pelo Conselho Interprofissional da RDD e a proposta que a Casa do Douro apresenta para a sustentabilidade da Produção (90.000 pipas), alinhadas com as vendas para Vinho do Porto face à redução proposta pelo comércio”, uma medida apresentada à posteriori pelo PCP através de um Projeto de Resolução entregue na AR e assinada pelos três deputados comunistas.

A produção afirma ainda que “a implementação desta proposta representa não apenas uma medida de apoio ao sector, mas também um investimento na preservação de um património económico, cultural e paisagístico único, que constitui uma das principais marcas da identidade portuguesa no mundo”.

Casa do Douro exige competências

Desde que foi aprovada a sua reinstitucionalização em 2024, a Casa do Douro não possui nem financiamento nem quadro de pessoal. Mesmo após a tomada de posse da nova direção, em janeiro deste ano, a situação ainda não está resolvida.

Em conferência de imprensa, marcada para apresentar a contestação ao pedido de inconstitucionalidade da Lei n.º 28/2024, apresentado pela ex-provedora de Justiça em março, junto do Tribunal Constitucional (TC), o presidente da direção, Rui Paredes, voltou a sublinhar a “urgência em capacitar a instituição de todas as suas funções, dando assim força à luta pelo pequeno e médio viticultor. Precisamos que o viticultor se sinta empoderado com a Casa do Douro. É este empoderamento que nós queremos que haja com esta lei“.

No entender da direção da Casa do Douro, há jurisprudência neste caso, apontando para as ordens de inscrição obrigatória em algumas profissões como medicina, advocacia, enfermagem ou outras.

Rui Paredes acrescenta ainda que “a inscrição obrigatória na CD é constitucional se cumprir três requisitos: que tenha uma base legal clara (restaurada por lei da Assembleia da República), um interesse público significativo (a defesa da produção e o equilíbrio interprofissional na fileira do vinho do Porto) e a proporcionalidade na restrição da liberdade de associação (visa evitar a fragmentação da representação dos produtores)”.

Para o Presidente da Casa do Douro, ““a finalidade é garantir uma representação forte, coesa e legítima dos viticultores. A inscrição obrigatória permite que a Casa do Douro tenha legitimidade efetiva para gerir recursos, coordenar estratégias de promoção, garantir qualidade na produção e intervir na regulação de preços e quotas”.

Tarifas dos EUA preocupam

À margem da apresentação da contestação para o Tribunal Constitucional, Rui Paredes falou ainda das recentemente aprovadas tarifas à entrada de produtos europeus nos EUA.

“Estamos preocupados, estamos expectantes, porque esperamos que o vinho não esteja incluído nisto, há esta possibilidade como um produto agroalimentar e preocupa-nos, porque o mercado americano é um mercado fundamental.

A venda de menos vinho neste mercado implica depois a não compra aos viticultores, a diminuição do que é o quantitativo do benefício. Ou seja, isto tudo nos preocupa e preocupa quando as próprias empresas ou o mercado americano é muito apetecível porque é um mercado muito valorizado. É de longe o mercado mais valorizado que nós temos ao nível da exportação”.

Em 2024, foram exportados cerca de 36 milhões de euros de vinho do Porto para os EUA, o que se traduz num aumento de 6,5% comparativamente com o ano anterior. A nível dos vinhos Denominação de Origem Controlada (DOC) Douro, o mercado norte-americano representou um volume de negócios que ronda os 5,6 milhões de euros.

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